quarta-feira, 17 de outubro de 2012

E ainda se preocupam com o fim do livro de papel - Leonardo Brasiliense.

 "Tudo o que eu disser aqui pode ser invalidado pelos fatos a curto prazo. Isso é história, não apenas possibilidade. A gente especula até que de modo criterioso, mas a realidade tem essa abertura ao inusitado, ao inimaginável e a partir de dados atuais, porque novos dados surgem e os panoramas mudam rapidamente. Qualquer problema de hoje pode não ter a menor importância amanhã.

Antes de falar sobre livro digital vou contar um fato: antigamente, os amplificadores de guitarra eram todos valvulados (lembram ou já ouviram falar dos televisores valvulados?). Pesados e caros, mas necessários e sem alternativas. Um dia um cara inventou o transistor e outro inventou de usar o transistor como base para o processamento do som num amplificador de guitarra. Eles ficaram mais baratos e mais leves. Mais adiante, já na era digital, outro cara inventou o simulador digital de amplificadores de guitarra. Agora o guitarrista pode ter vários modelos de amplificadores (clássicos ou novos) num único software, o que, além de tudo, facilitou o processo de gravação. Os amplificadores valvulados acabaram? Não. Eles continuam sendo objeto de desejo de todo guitarrista, embora continuem pesados e caros.

Por comodidade ou razões econômicas, muita gente usa os simuladores digitais, mas é consenso que nada substitui a sensação mecânica que se produz na interação da madeira do instrumento com a vibração das cordas e com o som "quente" produzido pelas válvulas e com os alto-falantes.

Parece que estou gastando muitos caracteres (e o editor da revista me impôs um limite para eles) falando de outro assunto. Mas acho que você me entendeu. Bem, e se entendeu direito, já sabe: esse consenso acerca do som "quente" das válvulas tanto pode durar para sempre quanto morrer em uma geração. Bingo.

Imagino que na passagem da pedra lascada ao papiro alguns questionamentos tenham sido parecidos com os atuais: ficou mais fácil "imprimir", guardar e transportar o texto, mas seu armazenamento passou a ser mais frágil, e os olhos tiveram que se acomodar a ler em novas texturas. O papel ficou, e hoje é inimaginável alguém escrevendo e lendo em pedras (claro que tem louco tarado fetichista para tudo, vá se saber.)

Para mim, o que se sobrepõe a qualquer polêmica é que as coisas não mudam por si, mas porque mudam as necessidades das pessoas. A questão do livro digital é apenas um subconjunto de outro bem maior: as pessoas estão transferindo tudo para o digital, o trabalho, o entretenimento, o contato com os amigos.... Então, transferir para esse meio a leitura passou a ser uma necessidade.

O que me preocupa mesmo é que as pessoas passem cada vez mais tempo em frente a uma tela de computador ou outro tipo de monitor do que voltadas para o mundo real (já assistiram ao WALL-E?). Nesse aspecto o livro digital até que nem é preocupante, porque não muda nada; ficar horas e horas lendo livros em papel também é uma forma de dar as costas para o mundo real (não estou questionando os méritos, os benefícios e a riqueza da leitura, apenas lembrando um fato); o problema é quando a telinha substitui o brincar na praça, o comer pipoca no cinema, o tomar chimarrão com o amigo.

Ainda tem gente preocupada com o fim do livro em papel?
E, como muito se diz: as necessidade de imaginar, de contar e ouvir histórias é anterior à mídia pela qual se satisfaz (falada, empedrada, empapelada, digitalizada). Anterior no tempo e também em termos lógicos.

Para sempre ou por enquanto."

Leonardo Brasiliense é guitarrista e escritor gaúcho. Maiores infos. : http://www.leonardobrasiliense.com.br/

Beijo, C.
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