sábado, 4 de fevereiro de 2012

Questão de perspectiva - Por Felipe Sandrin.

 "Aqui as pessoas querem ganhar dinheiro para não terem de acordar cedo." Fui acometido pelo choque cultural. Lembrei os problemas relatados junto aos primeiros telejornais nacionais que em suas previsões de tempo caracterizavam o sol no nordeste como "tempo bom".

Por mais brandas que mudanças possam parecer, ainda assim são mudanças. Geralmente no interior do Rio Grande do Sul as pessoas bem sucedidas financeiramente tendem a acordar cada vez mais cedo convictas em manter e multiplicar suas riquezas. Já em grande parte do país, um dos motivos pela busca da riqueza é justamente para não se ter de acordar cedo: claro que há exceções, mas ainda assim é regra.

Vocês notaram como as pessoas gostam de se mostrar sem tempo? Virou sinônimo de popularidade e importância dizermos: "Não posso, hoje não. Quem sabe semana que vem", e ao mesmo tempo tornou-se perigoso um simples convite para um café da tarde: "esse cara não trabalha."

Falamos de tempo como es não fossemos donos do nosso. Lamentamos as festas perdidas, viagens adiadas e chances desperdiçadas. Há um paralelo independente de nossas vontades nos levando aos compromissos para com a sociedade: sim, pois tu só te tornas livre aos olhos de outros quando o sono lhe faz dormir cedo e o relógio soe o seu acordar.

Nossa ordem de valores tem princípio narcisista. Se acharmos que prazer se resume em férias de vinte dias durante o ano, se trabalho significa acordar cedo e união familiar é o passeio de domingo, assim forjaremos nossas metas e classificaremos aqueles que nos cercam.

Sexo é amor? Bem, conheço muito mais pessoas dispostas a viver sem amor do que sem sexo, e isso é incompreensível para a grande maioria que antecede minha geração.

É isso que fazemos, não? Adequamo-nos para sobreviver, para não enlouquecer. Partindo da ideia de que não existe o certo quanto à forma de levar a vida que outros levam.

Uns correlacionam falta de tempo com "ser importante", outros julgam que tal falta se deve à subordinação. Uns preferem ser os primeiros a chegar e últimos a irem embora a fim de prosperar, outros colhem do sucesso uma vida sossegada.

Um senhor caminha pela rua quando uma bala o atinge próximo ao coração: este senhor teve azar em ser atingido ou sorte por não ter sido fatal? Viram? É apenas uma questão de perspectiva."


Texto escrito por Felipe Sandrin, publicado no Jornal Serra Nossa, edição do dia 03/02/12.

Beijo, C.

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